Testamento vital: já fez o seu?

Por Silvia Triboni*

Nesses tempos de distanciamento social provocados ela pandemia temos nos preocupado em preencher os nossos dias da melhor forma possível. Trabalho remoto; cursos à distância; reuniões online; concertos e espetáculos à distância são apenas algumas das atividades que temos feito nesses dias atípicos.

Mas, será que nesta ânsia de nos ocuparmos de maneira plena e produtiva não estamos a deixar de providenciar algo importante, que poderia facilitar a nossa vida futura e da nossa família?

Já pensou em elaborar o seu Testamento Vital, uma modalidade de Diretivas Antecipadas de Vontade?

Certamente, muitos afirmarão que seus dias têm sido plenos, e que ao final dessa pandemia sentirão que não desperdiçaram o seu tempo enquanto isolados, e, isso será muito bom. Se este é o seu caso, está aí mais um bom argumento para “arregaçar as mangas” e deixar em dia a sua pasta de documentos importantes, formalizando as suas vontades num Testamento Vital, também chamado Diretivas Antecipadas de Vontade.

Saiba que o Testamento Vital é um documento escrito que tem o objetivo de registar o tipo de atendimento médico ou cuidados de saúde, que gostaríamos de receber, ou não, perante uma doença com risco de morte, para que seja apresentado ao serviço de saúde no caso de estarmos impossibilitados de expressar a nossa vontade.

Por que fazer um Testamento Vital?

Ao longo de nossas vidas não costumamos pensar no seu término. Na verdade, evitamos lembrar que somos mortais. Entretanto, quando decidimos pensar a respeito disso, imaginamos que um dia poderemos ser submetidos (a nosso contragosto) a certos procedimentos médicos longos e dolorosos, os quais não necessariamente garantem uma boa sobrevida do paciente, e isso nos causa algum receio.

Afinal, temos o direito de não querer:

  • uma reanimação cardiorrespiratória;
  • ser submetidos a meios invasivos de suporte artificial de funções vitais;
  • medidas de alimentação e hidratação artificiais que apenas visem retardar o processo natural de morte;
  • tratamentos que se encontrem em fase experimental.
  • ser internados em uma instituição de longa permanência 

Estas são apenas algumas das razões que justificam temos em mãos o nosso Testamento Vital.

Nossas diretivas se destinam, portanto, à expressão destes nossos desejos, podendo, inclusive, incluir pedidos especiais como:

  • a assistência religiosa para quando se interrompam os meios artificiais de vida,
  • a presença de determinada pessoa para nossas despedidas.

Importante ressalvar que a recusa do nosso Testamento Vital aos tratamentos citados não diz respeito aos cuidados paliativos, caso possamos vir a precisar, uma vez que eles visam aliviar o sofrimento e possibilitar uma morte digna.

A urgência do Testamento Vital na pandemia da COVID-19

Ficou claro que a COVID-19 não vê idade, classe social ou condição de saúde, pois pode afetar todos.

Normalmente, quando pessoas hospitalizadas estão doentes demais para se manifestarem, seus entes queridos são chamados. Ocorre que as medidas de isolamento contra a COVID-19 podem impedir que familiares estejam presentes, a dificultar aos médicos o conhecimento dos desejos do doente.

Se o familiar não puder ser contactado, o paciente poderá ser intubado, e a ressuscitação poderá ser feita ao contrário da vontade do paciente.

Indivíduos mais velhos com doenças crônicas têm maior probabilidade de desenvolverem doenças graves em razão da COVID-19, sendo, eles, pessoas que podem querer uma morte natural, ou para os quais a cura poderia ser uma exceção. A disponibilidade de um Testamento Vital nessas horas seria providencial.

O momento é delicado e justifica a presente reflexão acerca da preparação do nosso Testamento Vital ou Diretivas Antecipadas de Vontade.

Ponderações e conversas importantes

1 – Reflita

Redigir este documento envolve algumas etapas, sendo a primeira delas, a nossa vontade, a análise introspectiva de nós mesmos, quanto ao que realmente queremos em face da possibilidade de final de vida.

Relevante deixar claro, que o Testamento Vital não diz respeito à eutanásia. Autoriza a escolha entre o adiamento da morte ao custo de sofrimento e a ortotanásia, ou seja, a possibilidade de ter uma morte digna, mediante o desejo do paciente, sem prejuízo de a ele serem oferecidos os cuidados paliativos para alívio da dor e outros sofrimentos.

2 – Converse com o seu médico.

Antes de escrever o seu Testamento Vital converse com o seu médico de confiança e entenda claramente o que as suas escolhas poderão significar.

Aprenda um pouco sobre intervenções médicas que sustentam a vida, como, por exemplo:

  • ressuscitação cardiopulmonar (medidas para reiniciar o coração e a respiração);
  • intubação (uso de um ventilador para respirar);
  • nutrição artificial (alimentação por meio de um tubo no nariz ou no estômago).

3 – Envolva a sua família nesta decisão.

Fale abertamente com a sua família sobre os seus valores e desejos para que o seu Testamento Vital seja realmente respeitado.

Na ocorrência das intervenções mencionadas acima, o sistema de saúde poderá fazer perguntas difíceis a nossos filhos, ou cônjuges, situação em que emoções desafiadoras surgirão. Porém, de posse de nossa diretiva antecipada de vontade, as respostas a tais questões serão menos angustiantes, pois expressará os cuidados que desejamos receber do atendimento médico.

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Silvia Triboni é editora e produtora de conteúdo sobre longevidade, economia prateada e benefícios do turismo para o envelhecimento saudável no site Across Seven Seas www.acrosssevenseas.com

silvia.triboni@gmail.com